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segunda-feira, 5 de março de 2012

CONFORMISMO? OU COVARDIA ?


O conformismo da oficialidade militar estadual



A formação do oficial militar estadual não difere em muito do passado, ou seja, os jovens são submetidos a um rigoroso sistema de pressão, tendo como ameaça maior o desligamento sumário do curso cujo ingresso é disputadíssimo. Salvo pequenas reações de desistência, algumas descaradamente induzidas por ampliação de pressões sobre determinado aluno-oficial que ao sistema interessa descartar (digo-o genericamente, sem a pretensão de focalizar caso algum), a maioria se adapta e se vai tornando conformada, de tal modo que a submissão culmina por se integrar ao psiquismo individual e coletivo dos oficiais militares estaduais, mais até que entre graduados e praças, que são em maior quantidade e nos quartéis se apresentam apenas para cumprir serviços externos, situação rotineira em que são obrigados a discernir individualmente, demais de ampliar a solidariedade entre eles em razão dos reais riscos de morte no exercício da profissão. Mesmo assim, o rigor excessivo não deixa de funcionar como elemento de pressão a inibir reações na base da pirâmide hierárquica, especialmente por conta de punições a generalizar exceções pela difusão sensacionalista, o que afeta a tropa como um todo.
A desgraça do conformismo, como eu denunciei em romance (O Espião – vide sitewww.emirlarangeira.com.br), decorre de rupturas violentas produzidas na mente dos submissos, tornando-os “corpos dóceis” (vide Vigiar e Punir – Michel Foucault), não importando se consciente ou inconscientemente. No caso específico da oficialidade, como o sistema de pressão predomina sobre a individualidade dos cadetes durante três anos, o final do curso lhes representa uma aparente vitória contra os grilhões, até que eles descobrem que, como aspirantes a oficial, o espectro do desligamento ainda os ameaça, e assim a carreira dos jovens segue debaixo do ferrão de seus superiores, enquanto eles, jovens oficiais, vão forjando seus próprios ferrões para ameaçar quem lhes está subordinado (eis como sofrem silenciosamente os novos oficiais, os graduados e as praças, e quem quiser que enfie a carapuça, com a ressalva de que cuido de cultura e não de pessoas e sei que muitos superiores são bons e justos). Entretanto, não se há de negar o fingimento da expressiva maioria a alardear uma “disciplina consciente” que não passa de falácia.
A perda da individualidade, – ou sua dissimulação em vista da exteriorização obrigatória de submissão às regras formais e informais (no militarismo, uma regra não difere em muito da outra, pois, em falhando a informal, logo emerge a formal com facilidade espantosa), – a perda da individualidade torna-se traço de cultura predominante e enfraquece o espírito do oficial desde cedo, fraqueza que o acompanhará até alcançar seu objetivo maior: a inatividade. No entanto, mesmo depois dela o sistema de pressão não fenece, os regulamentos foram feitos para alcançar quase que a alma do indivíduo. Lembra a prática czarista a registrar como propriedade valiosa para a nobreza rural a alma do escravo, que podia ser vendida a outrem para se somar aos escravos vivos, variando o preço de acordo com a utilidade do corpo em vida (Vide Almas Mortas, romance de Nikolai Vasilievich Gogol). Eis também a Wikipedia sobre o czarismo: O Imperador de todas as Rússias é um monarca autocrata e ilimitado (Czar): O próprio Deus determina que o seu poder supremo seja obedeci¬do, tanto por consciência como por temor. (Artigo I das Leis Fundamentais do Império, publicadas em 1892. Cita¬do por KOCHAN, L., Origens da Revolução Russa, Zahar Editores, pág. 60)
Sim, vem de longe o “temor” como fundamento da obediência cega ao poder pelos civis, e elevado ao extremo no militarismo dos corpos dóceis, o mesmo que ainda prevalece na cultura dos exércitos e assemelhados (as Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares), embora a maioria não assuma o detestável perfil talvez por se ver embolada entre si, mandando e sendo mandada. Ora, todos fingem, na verdade, amar a obediência às regras do “mandar com” (“comandar”), assim como os indivíduos fingem crenças religiosas várias com vistas à salvação da alma, sendo certo que as almas dos escravos russos não possuíam esse direito, já que o Czar se garantia por seu poder terreno emprestado por nada mais nada menos que Deus e não libertava as almas escravas do jugo terreno... E, pelo visto, a alma do militar estadual não difere em muito da “alma escrava” dos czares, pois o “RG” (Registro Geral) segue existindo após a morte do seu corpo por meio dos pensionistas. Claro que a comparação é grosseira, mas talvez nem tanto, pois “RG” de coronel vale mais que “RG” de soldado, distinção social (financeira) visível entre viúvas que não se misturam, inobstante serem todas oriundas da senzala...
Muitos neste instante dirão que tresvario, que pirei de vez, que endoideci deveras, mas é só observar os movimentos reivindicatórios para percebermos que é mínima a participação da oficialidade militar estadual aqui e algures. Não falo de greve, mas de movimentos como os da PEC 300, pacíficos e assumidos por muitos políticos que hoje “espirram o taco” na maior caradura. Sim, é incrível que a oficialidade suma do mapa e nem mesmo se mobilize em associações, que efetivamente existem, mas são fracas por falta de representatividade quantitativa. Na verdade, as entidades se sustentam por conta de oficiais tão antigos que os informativos de óbitos dos associados até parecem mau agouro... E a continuar como nos dias de hoje, a tendência aqui no RJ é a de extinção por estagnação dos quadros de associados, até que a morte os alcance e as entidades representativas de oficiais entrem em irremediável processo entrópico...
Honestamente, não sei como esse conformismo será vencido. E o mais desagradável é que a oficialidade estuda Psicologia Social e outras ciências sociais que também cuidam do assunto, não sendo, portanto, novidade para ninguém: todos sabem que estão conformados. Por que então não há qualquer reação inconformada, individual ou coletiva, em vista de reivindicações justas? Por que a oficialidade não se associa, por exemplo, à AME/RJ (antigo Clube dos Oficiais da PMERJ e do CBMERJ), de modo a engrossar as fileiras da entidade e legitimar o seu presidente no âmbito político, que depende bem mais de quantidade que de qualidade?... Ou melhor, necessita do aspirante a oficial e do coronel, sem distinção de posto ou patente, porque lá os sócios se equivalem independentemente de hierarquia, posto se igualarem no valor idêntico do voto individualizado e secreto... Por que também os inativos se mantêm autistas em relação aos movimentos reivindicatórios e torcem de longe?... Ah, honestamente, – e como eu já confessei, – não sei... Por isso imagino que a oficialidade militar estadual seja hoje o mais autêntico manancial de conformismo a merecer estudo acadêmico, embora eu creia que o resultado é adrede sabido... Ora, por que não nos unimos para evitar o abismo do desenho acima e agimos como 
sugere o desenho abaixo?...








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